sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Minha rua


Minha rua


 

            Minha rua tem nome de herói de guerra, um herói que não conhecemos, fora ser o nome da rua que moro há 31 anos, não tem significado nenhum seu nome. Sebastião Francisco de Oliveira, nome que falei tantas vezes em fichas e documentos. A única referência a ele que tenho, era uma placa azul no começo da rua, que dizia, “Herói da Guerra de 1932”, se isto é real não sei, mesmo sendo de formação historiador, nunca encontrei seu nome em arquivo nenhum.

            Mas saber que ele era herói de guerra povoou minha mente infantil por anos, pensava: como ele era? Como teria sido a guerra? Será que ele era oficial? O colégio principal de meu bairro chamava-se Cel. Mario Rangel, fazia ligações infantis que todos os nomes das ruas próximas fossem de soldados sobre a ordem deste coronel, com o tempo descobri que não, (mas à história do colégio fica para outro texto). Entretanto aqueles heróis eram tudo para mim. Eles participavam das minhas aventuras, eu era um soldado, o Francisco (o da rua) era outro, e guerreávamos contra um monte de inimigos.

            Depois descobri que a tal guerra era a Revolução Constitucionalista, de 1932, este fato aumentou meu desejo separatista. Ficava imaginando, “se São Paulo fosse um país, nossa cidade seria um estado e o Capão Redondo seria uma cidade, então poderia ser o prefeito dela”, isto aguçou minhas pretensões políticas por anos.

             O mais gostoso da minha rua era que, nós nos conhecíamos. Havia duas quadras, na primeira morava um tio meu (Tio Joel), um dos primeiros  moradores, na segunda quadra estava minha casa. Na esquina, com a Rua João Joaquim Bonh, tinha o bar do português, onde eu comprava pão pela manhã. Lembro-me que tinha uns quatro para cinco anos quando fui buscar pão sozinho pela primeira vez. Meu pai ficou conversando em frente da casa com os vizinhos e eu fui buscar cinco pães, eu era grande agora, havia feito à passagem.

            Ao lado do bar ficava a maior casa da rua a do Seu Julio e da Dona Olivia, eles tinham uma filha, mas ela nunca brincava na rua. Do lado oposto morava, Dona Dioclecia e seu marido, do lado dela Dona Antônia, eles eram os dois casais mais idosos de nossa rua, em frente a casa deles não podia gritar.

            Ao lado da Dona Olivia, morava o Roberto, meu grande amigo, com seus pais, Dona Ângela e Seu Humberto, eles tinham um Opala marrom, o carro mais bacana da rua, era lindo vê-lo sendo lavado fim de semana. Na casa acima o Fabio, filho da Dona Renata, em seguida a casa do Seu Nelson, o artista da rua, os filhos dele foram e são meus amigos até hoje. O mais velho era o Fi (assim que chamávamos), depois o Alexandre - do qual tenho boas histórias para contar dele - a Cristiane e o Henrique, que eram os mais novos, com quem brincava horas e horas na rua.

            Mais acima havia a casa do seu Benevides, depois a da vô do Tiago, a da Dona Miralva (onde eu assistia TV) e a última, casa do lado esquerdo, era de um senhor que possuía um guincho.

            Eu morava do outro lado da rua. Na esquina, com a Rua Manuel Peres, morava o Senhor José da Dona Domingas, foi ele que me levou para assistir, na televisão deles, o enterro do Tancredo Neves, foi meu primeiro evento político. Ele havia sido militar, e passava horas contando como era bom o tempo que passara nas forças armadas, eu achava a filha dele linda.

            Nossa casa era a próxima, número 412.  Tinha um jardim na frente e outro atrás, minha mãe cultivava rosas e mato de chá (era assim que falávamos), havia um pé de ameixa, um de chuchu. Minha casa era pequena, tinha uma sala, cozinha, lavanderia e um quarto. A lavanderia tinha uma porta branca, que eu abarrotei de adesivos de políticos. Todo dia ao chegar, meu pai, cantava uma música. Minha mãe perguntava quem era, e ele prontamente respondia: “É o frio”. E lá vinha a musiquinha de uma loja de departamento da época.      

            Nossa rua tinha outras casas, abaixo da minha, havia uma granja, depois, era a casa da Dona Rita, a casa do Rodrigo da Dona Naná, a do Mauricio, a da Dona Gertrudes e Seu Wilson, e voltávamos à Dona Antônia.

            Foi ao lado destas pessoas que cresci, foi com elas que formei meu caráter, que aprendi lições de vida. Nesta pequena rua de periferia, com um pouco mais de vinte famílias, que fui criado. Brincando na rua de terra, jogando bola, esfolando os pés, não havia luxo, mais aquela realidade era muito rica para todos nós.

            Foi assim, que um herói de guerra desconhecido, virou uma das maiores referencias da minha vida. 

               

2 comentários:

  1. Lindo texto! Até eu me senti nostálgica,afinal relembrei-me de muitos nomes citados. Como pofessor de história ainda não tive a honra de conhece-lo, mas como historiador você foi capaz de narrar sua rua com tanta precisão que me reportei aos tempos antigos. Parabens!

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  2. Obrigado, esta empreitada é um sonho, meu objetivo é postar um texto por semana, vamos ver se vira. Obrigado pela leitura e apoio.

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